segunda-feira, 3 de junho de 2013

Uma sombrinha, por favor! (Ou melhor: uma boa história, agora!)



Estava tudo tão bem no verão que começou a sentir os ventos tremerem em si mesma, no outono, e o corpo  a esfriar no inverno. Não era lá fora que ventava frio. O frio fazia redemoinhos gelados em seu próprio corpo até se acoplar na garganta. Deu um nó, um bolo, um incomodo de palavras não ditas, de medo e desamparo: estou morrendo. Não de morte súbita, mas daquela morte que todos nós experimentamos simplesmente por existir.

Desamparada em um mundo desamparado. Fazia questão de estar com sua sombrinha, notem bem o sentido metafórico disso, mesmo se não estivesse chovendo. Protegida caso as águas caíssem do céu. Quisera poder erguer uma sombrinha dentro de si mesma, contra eventuais tempestades.

A garganta doía. Doía porque nenhuma sombrinha no mundo poderia protegê-la daquela enxurrada de palavras contidas.  Das coisas que ela não fez e, por não ter feito, não poderia dizer nada sobre elas. Das coisas que ela fez e já não poderia mais voltar no tempo para poder contá-las de um jeito diferente.  Do tempo que passava e não levava a dor embora.


Nada mais lhe restava do que assumir: a sombrinha é um adorno, um charminho para disfarçar e enfeitar a fragilidade que é viver. Também não há outro remédio para as palavras que lhe embolaram a garganta, senão o de estruturar um modo de retirá-las de lá. O desconforto está em saber que tal estrutura demanda invenção. É preciso algo muito criativo para que as palavras se sintam seguras para saírem, com certa elegância, da garganta. Por isso as palavras lhe doem, demandam uma narrativa, e não é fácil inventar uma história, mesmo quando as palavras suplicam para sair.  

Nenhum comentário:

Postar um comentário